sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014




















Ninguém me disse
que a saudade é uma flecha ensaguentada
que esgarça e rasga o mais duro e couraçado peito

Ninguém me disse
que os incêndios são demónios soltos
em peitos já muito doídos
feitos por muitas setas ensaguentadas

Ninguém me disse
que os olhos podem sair das órbitas
e as mãos arrancarem os cabelos em desespero
que as aves podem não voltar
na próxima primavera
ou os campos se recusarem a florir

Ninguém me disse
tanta coisa
e tanta coisa passa por mim
inevitavelmente
como um comboio a quem impõem o travão
e ele simplesmente não pára
porque não consegue

Ninguém me disse
que os dias ardem como folhas de papel
consumindo todas as palavras
que não se disseram
e que as têmporas quase explodem de dor e raiva
como se o coração batesse nelas e não dentro do peito

Ninguém me disse
que as escadas do meu corpo
eram o caminho mais direito
para o inferno
e no entanto eu consumo-me
no patamar dos dias que ainda hão-de vir!...

são reis
270214



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